O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu nesta sexta-feira (28) prisão domiciliar à cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos. Ela é acusada de participar dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e de pichar a frase “Perdeu, mané” na estátua da Justiça, em frente ao prédio do STF, em Brasília.
Com a decisão, Débora deixará o presídio onde está detida desde março de 2023. A partir de agora, cumprirá a medida em prisão domiciliar, em sua residência em Paulínia (SP), sob monitoramento eletrônico.
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Prisão domiciliar: restrições e condições
A decisão de Moraes estabelece que a ré deverá usar tornozeleira eletrônica. Ela também está proibida de usar redes sociais, manter contato com outros investigados e conceder entrevistas sem autorização prévia do STF.
O descumprimento de qualquer uma dessas medidas pode levar Débora de volta à prisão. A decisão judicial atende parcialmente ao pedido da defesa, que argumentou que a acusada é mãe de dois filhos menores, de 10 e 12 anos.
Apesar de a Procuradoria-Geral da República (PGR) ter se manifestado contra a soltura, o órgão reconheceu que, com base no artigo 318 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderia ser substituída por prisão domiciliar, considerando a maternidade da acusada.
Condenação em julgamento interrompido
O julgamento que decidirá a condenação definitiva de Débora foi iniciado na semana passada, mas está suspenso por um pedido de vista do ministro Luiz Fux. Até o momento, apenas o relator, Alexandre de Moraes, votou.
No voto, Moraes propôs uma pena de 14 anos de prisão em regime fechado. A pena é baseada na soma das condenações por cinco crimes imputados pela PGR, em linha com outras sentenças já proferidas contra envolvidos nos atos de 8 de janeiro.
Crimes atribuídos e cálculo da pena
Segundo o relator, os crimes cometidos são de natureza multitudinária, ou seja, de autoria coletiva. Por isso, os réus respondem de forma solidária pelos danos causados. A pena de 14 anos foi calculada da seguinte forma:
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: 4 anos e 6 meses
- Golpe de Estado: 5 anos
- Associação criminosa armada: 1 ano e 6 meses
- Dano qualificado: 1 ano e 6 meses
- Deterioração de patrimônio tombado: 1 ano e 6 meses
Como a pena ultrapassa 8 anos, o regime inicial de cumprimento seria o fechado, conforme determina a legislação penal brasileira.
Indenização coletiva de R$ 30 milhões
Além das penas privativas de liberdade, os réus condenados pelos atos de 8 de janeiro deverão pagar, de forma solidária, uma indenização de R$ 30 milhões pelos danos materiais causados aos prédios públicos invadidos e depredados, incluindo o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o STF.
A quantia foi estipulada com base em laudos técnicos e orçamentos apresentados por órgãos públicos, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Arrependimento e depoimento ao STF
Em depoimento prestado ao Supremo Tribunal Federal no ano passado, Débora Rodrigues dos Santos afirmou que se arrepende de ter participado dos atos e de ter pichado a estátua da Justiça.
Segundo a defesa, a acusada não possui antecedentes criminais e teria sido influenciada por grupos extremistas nas redes sociais. A defesa também argumenta que a ré não participou de atos violentos, limitando-se à pichação.
Contexto dos atos de 8 de janeiro
Os atos de 8 de janeiro de 2023 foram classificados pelo STF e por diversas instituições como uma tentativa de golpe de Estado. Milhares de manifestantes invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, em protesto contra o resultado das eleições presidenciais de 2022.
As investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal apontaram que os atos foram organizados por grupos extremistas, com financiamento e apoio logístico de empresários e agentes políticos.
Até o momento, mais de 100 pessoas já foram condenadas pelo STF por participação direta nos atos. As penas variam entre 12 e 17 anos de prisão, além de multas e indenizações.
Impacto político e institucional
A concessão da prisão domiciliar ocorre em um momento de revisão das medidas cautelares impostas aos réus do 8 de janeiro. O STF tem analisado caso a caso, considerando fatores como antecedentes, gravidade das condutas e condições pessoais dos acusados.
Especialistas em direito penal e constitucional apontam que a decisão de Moraes está em conformidade com o princípio da proteção integral da criança e do adolescente, previsto na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Além disso, a medida reflete a jurisprudência do STF sobre a substituição da prisão preventiva por domiciliar quando a ré é mãe de filhos menores, conforme decidido no HC 143.641, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski.
Repercussão no Amazonas e em Manaus
Embora o caso de Débora Rodrigues não tenha relação direta com o Amazonas, a decisão do STF tem reflexos no estado. Segundo dados da Polícia Federal, ao menos 12 pessoas do Amazonas foram identificadas como participantes dos atos de 8 de janeiro, sendo que algumas ainda aguardam julgamento.
A Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) e a Câmara Municipal de Manaus (CMM) já discutiram moções de repúdio aos atos antidemocráticos. Em 2023, o governador Wilson Lima (União Brasil) também se manifestou em defesa da democracia e da ordem institucional.
O caso reforça o debate sobre a responsabilização penal e os limites da liberdade de expressão, especialmente em um contexto de polarização política e disseminação de desinformação nas redes sociais.
Possíveis desdobramentos
Com o julgamento ainda em aberto, a decisão final sobre a condenação de Débora Rodrigues dependerá do voto dos demais ministros. Caso a maioria acompanhe Moraes, a ré poderá ser condenada a 14 anos de prisão, mesmo estando em prisão domiciliar.
Se condenada, a pena poderá ser executada imediatamente, conforme jurisprudência do STF em casos de crimes contra o Estado Democrático de Direito. No entanto, a defesa poderá recorrer, inclusive ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O caso também pode abrir precedente para outras mães investigadas pelos atos de 8 de janeiro que se encontram presas preventivamente, reforçando a necessidade de análise individualizada das medidas cautelares.
Conclusão
A decisão de Alexandre de Moraes representa um marco na condução dos processos relacionados ao 8 de janeiro. Ao conceder prisão domiciliar com base em garantias constitucionais, o STF reafirma seu compromisso com o devido processo legal e os direitos fundamentais, mesmo diante