A Prefeitura de Anori, no interior do Amazonas, firmou contrato de R$ 120 mil com a empresa RC Pereira para prestação de serviços de mídia e redes sociais. No entanto, uma consulta ao CNPJ 42.959.286/0001-43, informado no contrato, revelou que o número é inválido na base da Receita Federal.
O contrato foi celebrado por inexigibilidade de licitação (nº 042/2025), com base no artigo 74, inciso III, da Lei nº 14.133/2021, que permite essa modalidade quando houver inviabilidade de competição, como na contratação de profissionais de notória especialização.
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Empresa com CNPJ inválido pode indicar fraude
A ausência de registro do CNPJ compromete a legalidade do contrato. Segundo a Lei nº 8.666/1993, ainda vigente em pontos não revogados pela nova Lei de Licitações, é obrigatória a verificação da habilitação jurídica da contratada, o que inclui CNPJ regular.
Caso se comprove que a empresa contratada não existe formalmente, o ato pode configurar fraude à licitação e desvio de recursos públicos, com base nos artigos 90 e 96 da Lei nº 8.666/1993 e no artigo 312 do Código Penal, que trata de peculato.
Contrato destina verba da educação para publicidade
Outro ponto controverso é a origem da verba. A dotação orçamentária utilizada é vinculada à “Manutenção da Rede de Ensino Fundamental”, conforme o projeto/atividade 2019 citado no contrato. Direcionar esse recurso para “administração de redes sociais e produção de vídeos” pode configurar desvio de finalidade orçamentária, prática vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000).
Município enfrenta carência extrema em serviços básicos
Com uma população estimada em 17.932 pessoas, segundo o IBGE, Anori tem IDH de 0,561, considerado baixo. O município apresenta indicadores preocupantes:
- Apenas 36,36% do esgoto é coletado.
- Nenhum esgoto coletado é tratado.
- 31,87% dos domicílios não possuem água canalizada.
- Apenas 37,99% da população urbana recebe coleta de resíduos.
- Não há coleta seletiva porta a porta.
- Registros de mortes por doenças relacionadas ao saneamento entre 1996 e 2020.
Prefeito é responsável direto pelo contrato
O contrato foi assinado pelo prefeito Reginaldo Nazaré da Costa, em janeiro de 2025, e publicado no Diário Oficial dos Municípios do Amazonas, edição 3833, em 4 de abril de 2025. A responsabilidade legal direta torna o gestor sujeito a sanções civis, penais e administrativas, conforme previsto na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).
Possíveis encaminhamentos legais
Diante das possíveis irregularidades, o caso pode ser encaminhado para:
- Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM): para apuração de improbidade.
- Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM): para análise da legalidade do contrato.
- Controladoria-Geral da União (CGU): se houver uso de verbas federais.
- Polícia Federal, caso envolva falsidade ideológica ou uso de CNPJ inexistente.
O que diz a legislação
A contratação direta sem comprovação da existência da empresa pode violar:
- Art. 90 da Lei 8.666/1993 – Fraude em licitação.
- Art. 96 da Lei 8.666/1993 – Fraude na execução do contrato.
- Art. 312 do Código Penal – Peculato.
- Art. 11 da Lei 8.429/1992 – Ato de improbidade por violação dos princípios administrativos.
- Lei nº 14.133/2021, art. 74 – Exige notória especialização e inviabilidade de competição devidamente comprovada.
Transparência e controle social
A divulgação desse tipo de contratação reforça a importância da atuação da imprensa e da sociedade civil na fiscalização do uso dos recursos públicos. A contratação da RC Pereira, ainda que válida sob a ótica da inexigibilidade, precisa obedecer aos critérios de legalidade, economicidade e moralidade.
Licitação passagens de barco
Na edição do dia 3 de abril do Diário Oficial dos Municípios, a prefeitura de Anori já havia homologado outra licitação um tanto controversa. Ela contratou mais de R$ 2,3 milhões em passagens de barco entre o município, Manacapuru e Manaus.