Contrato firmado pelo Ministério do Trabalho destina verba para retirada de lixo e capacitação ambiental
O Ministério do Trabalho destinou R$ 15,8 milhões à ONG Unisol Brasil, ligada ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, para executar ações de retirada de lixo na terra indígena Yanomami, em Roraima. O repasse foi feito em parcela única no dia 31 de dezembro de 2024, apenas três dias após a assinatura do termo de fomento.
Leia Mais:
O convênio foi firmado por meio da Secretaria Nacional de Economia Popular e Solidária, dirigida por Gilberto Carvalho (PT), ex-ministro e aliado histórico do presidente Lula. A justificativa oficial para o repasse imediato foi o caráter emergencial da crise humanitária enfrentada pelos Yanomami.
ONG opera em sindicato e será responsável por subcontratações
A Unisol, presidida por Arildo Mota Lopes, ex-diretor do sindicato metalúrgico, atua em um espaço de apenas 40 m² no subsolo do sindicato, em São Bernardo do Campo (SP). Segundo informações da entidade, a execução do projeto contará com a subcontratação de serviços de limpeza, contabilidade, assessoria jurídica e coordenação técnica.
O edital que possibilitou a contratação foi lançado em novembro e previa também a capacitação de catadores de recicláveis e ações de educação ambiental. Das dez ONGs participantes do processo seletivo, cinco foram desclassificadas por ausência de planos de trabalho consistentes.
Além da Unisol, o Centro de Estudos e Assessoria (CEA) também foi selecionado, recebendo R$ 4,2 milhões para atividades similares.
Crise Yanomami continua exigindo resposta urgente
Apesar do repasse antecipado, as ações em campo ainda não começaram. O início das atividades está condicionado à realização de reuniões técnicas e estudos de viabilidade logística e sanitária.
O governo federal vem reforçando políticas para a população indígena desde o início da crise na terra Yanomami, agravada por desnutrição infantil, malária e impactos do garimpo ilegal. Em 2023, o governo destinou R$ 254 milhões para a gestão de políticas indígenas.
Mesmo assim, a escolha de uma ONG com vínculos político-sindicais e estrutura modesta levanta questionamentos sobre a eficácia e transparência do uso dos recursos públicos.
Presidente da Unisol e dirigentes se recusam a comentar
A direção da Unisol não respondeu aos pedidos de entrevista da reportagem do jornal O Estado de S. Paulo. O presidente da entidade, Arildo Lopes, teria recusado ligações e não retornado os contatos. Outros dois dirigentes da ONG também foram procurados, sem sucesso.
O termo de fomento firmado prevê metas específicas a serem cumpridas durante a execução do projeto. Em nota técnica interna, o ministério afirmou que a comissão responsável pela seleção avaliou os projetos “com base em critérios técnicos e impacto social estimado”.
Relações políticas sob escrutínio
O vínculo entre a ONG beneficiada e o PT — partido do presidente Lula — é apontado por críticos como sinal de politização de repasses públicos. Gilberto Carvalho, hoje no Ministério do Trabalho, foi chefe de gabinete de Lula entre 2003 e 2010, além de ter sido ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência no governo Dilma.
Apesar disso, a legalidade do repasse não foi contestada judicialmente até o momento. Parlamentares da oposição, no entanto, prometem solicitar explicações ao ministério e podem acionar órgãos de controle como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério da Transparência.
Contexto no Amazonas e impactos futuros
No Amazonas, a situação da terra Yanomami tem gerado forte repercussão política e social. Organizações indígenas e entidades de apoio cobram mais agilidade na aplicação de recursos e denunciam o retorno do garimpo ilegal em áreas críticas da floresta.
Especialistas alertam que a morosidade na implementação das ações contratadas pode comprometer ainda mais a saúde das comunidades e a recuperação ambiental da região, com efeitos diretos na segurança alimentar e sanitária.
Enquanto isso, o caso amplia o debate sobre uso de convênios com ONGs e critérios técnicos para seleção, tema que também interessa à gestão municipal e estadual no Amazonas, que dependem de parcerias semelhantes para executar programas sociais.