O Ministério Público Federal (MPF) abriu procedimento para apurar a legalidade da nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), publicada nesta quarta-feira (16), que restringe o acesso de crianças e adolescentes a terapias hormonais voltadas a pessoas trans.
Segundo o MPF, a medida foi motivada por denúncias da Associação Mães pela Diversidade e da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), que questionam os impactos da norma sobre o direito à saúde e à identidade de gênero.
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MPF questiona veto a terapia hormonal para adolescentes trans
De acordo com a nova resolução do CFM, o bloqueio hormonal está proibido para menores de 18 anos com incongruência ou disforia de gênero. A hormonização cruzada só poderá ocorrer a partir da maioridade. Cirurgias de redesignação de gênero também ficam restritas a maiores de 18 anos, e, em caso de procedimentos com efeito esterilizador, a partir dos 21 anos.
O MPF considera que a norma pode violar direitos fundamentais. O procurador regional dos Direitos do Cidadão no Acre, Lucas Costa Almeida Dias, enviou ofício ao CFM solicitando, em 15 dias, os fundamentos técnicos e jurídicos da decisão.
Decisão contraria diretrizes da OMS e jurisprudência do STF
O MPF destaca que a Organização Mundial da Saúde (OMS) não considera mais a transexualidade como transtorno mental desde 2019, reforçando a necessidade de acesso a cuidados médicos adequados. O órgão também menciona decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconhecem o direito à identidade de gênero como parte da dignidade da pessoa humana.
“As entidades comunicaram o fato e demonstraram a preocupação de familiares de crianças com variabilidade de gênero ou adolescentes trans que sofrem de disforia de gênero e que têm acesso a procedimentos terapêuticos como bloqueio puberal e hormonização cruzada”, informou o MPF.
Resolução do CFM pode afetar políticas públicas de saúde
Especialistas alertam que a medida pode impactar o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), que oferece acompanhamento multidisciplinar para pessoas trans. A restrição pode levar à judicialização de tratamentos e ao aumento da vulnerabilidade de jovens trans em situação de sofrimento psíquico.
O texto do CFM também determina que pessoas trans com órgãos reprodutivos biológicos devem buscar atendimento preventivo com especialistas do sexo biológico, o que pode gerar constrangimentos e barreiras no acesso à saúde.
O MPF avalia que a resolução pode contrariar princípios constitucionais e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção Interamericana contra Todas as Formas de Discriminação.
Próximos passos e possíveis desdobramentos
O CFM terá até o fim do prazo solicitado para apresentar justificativas. Caso o MPF entenda que houve violação de direitos, poderá recomendar a revogação da norma ou ingressar com ação judicial.
O caso pode repercutir em outras esferas, como o Congresso Nacional, onde tramitam projetos sobre o atendimento a pessoas trans, e no STF