O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou nesta sexta-feira (28) que considera “bom julgar este ano” o processo que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro. A declaração foi dada após aula inaugural na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), em meio ao avanço da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Segundo Barroso, antecipar o julgamento evita que o caso coincida com o calendário eleitoral de 2026, ano em que o país escolherá o próximo presidente da República. “Seria bom julgar este ano para evitar o ano eleitoral”, declarou o ministro.
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O ministro ponderou que a tramitação do processo deve respeitar o devido processo legal. “O devido processo legal vem à frente do ano eleitoral. Portanto, vai depender da tramitação”, afirmou. Barroso não participa diretamente do julgamento, já que o caso tramita na Primeira Turma do STF.
Na última terça-feira (25), a Primeira Turma da Corte aceitou parte da denúncia da PGR contra Bolsonaro e outros sete aliados. Eles são acusados de integrar o núcleo central de uma organização que teria atuado para abolir, de forma violenta, o Estado Democrático de Direito.
O processo é conduzido pelos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, que compõem a Primeira Turma. O colegiado decidiu, por unanimidade, que o julgamento não será levado ao plenário, conforme previsto no Regimento Interno do STF.
Denúncia da PGR aponta plano golpista iniciado em 2021
De acordo com a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, o plano golpista teria se iniciado em meados de 2021. A estratégia envolvia ataques sistemáticos ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas, com o objetivo de desacreditar o processo democrático.
Os eventos culminaram em 8 de janeiro de 2023, quando manifestantes bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília. Ao todo, 34 pessoas foram denunciadas por crimes como:
- Golpe de Estado;
- Tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito;
- Organização criminosa armada;
- Dano qualificado com violência e grave ameaça;
- Deterioração de patrimônio tombado.
As penas somadas podem ultrapassar 30 anos de reclusão, conforme a legislação penal brasileira.
Bolsonaro alega perseguição política e tenta se manter no debate eleitoral
Após o recebimento da denúncia, Bolsonaro afirmou que o processo está sendo acelerado para impedi-lo de participar das eleições presidenciais de 2026. “Querem me julgar rápido para eu não chegar livre em 2026”, disse o ex-presidente.
Apesar da declaração, Bolsonaro está inelegível desde 2023, quando foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder político durante as comemorações do Bicentenário da Independência, em 7 de setembro de 2022.
Mesmo inelegível, o ex-presidente segue ativo politicamente e tem buscado influenciar o cenário eleitoral, inclusive em estados como o Amazonas, onde mantém base de apoio entre parlamentares e setores conservadores.
Barroso defende punições para evitar repetição de atos golpistas
Questionado sobre o tamanho das penas impostas aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, Barroso afirmou que as condenações seguem a legislação penal e são necessárias para evitar novos ataques à democracia.
“Foram muitos crimes e, mesmo aplicando a pena mínima, resulta em uma pena elevada”, justificou. O ministro também comentou sobre a mudança de percepção pública em relação aos condenados.
“Quando os episódios acontecem, as pessoas têm uma indignação profunda. Depois, na medida em que o tempo passa, elas vão ficando com pena. Porém, a não punição desse episódio pode fazer parecer que, na próxima eleição, quem não estiver satisfeito pode pregar a derrubada do governo eleito”, alertou.
Barroso concluiu que a responsabilização é essencial para a estabilidade institucional do país. “Não é bom para a democracia, nem para o futuro do país, que prevaleça esse tipo de visão”, afirmou.
Impacto político e institucional do julgamento
O julgamento de Bolsonaro e seus aliados pode ter efeitos relevantes no cenário político nacional. A depender do ritmo da tramitação, o processo poderá influenciar o debate eleitoral de 2024 e 2026.
Especialistas apontam que a eventual condenação do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado consolidaria sua inelegibilidade e enfraqueceria sua influência política. Por outro lado, uma tramitação lenta pode alimentar o discurso de perseguição e mobilizar sua base.
No Congresso Nacional, parlamentares da oposição têm criticado o STF, enquanto setores governistas defendem a atuação da Corte. No Amazonas, políticos locais monitoram os desdobramentos, já que a região tem representantes federais alinhados ao bolsonarismo.
Em Manaus, o tema também repercute na Câmara Municipal, onde vereadores debatem os limites entre liberdade de expressão e incitação ao crime. A polarização nacional reflete nos debates municipais, especialmente em ano pré-eleitoral.
Tramitação do processo pode durar meses
Após o recebimento da denúncia, o processo entra na fase de instrução. As defesas poderão apresentar testemunhas, requerer diligências e solicitar perícias. Segundo Barroso, o número de réus e a complexidade das provas podem estender o prazo de julgamento.
“Depende do número de testemunhas que cada réu vai indicar, depende se eles vão pedir prova pericial que demande mais tempo”, explicou o ministro.
O STF já condenou dezenas de envolvidos nos atos de 8 de janeiro, com penas que variam entre 3 e 17 anos de prisão. A expectativa é que os julgamentos mais complexos, como o de Bolsonaro, exijam maior tempo de análise.
Democracia em teste: o papel do STF
O Supremo Tribunal Federal tem sido protagonista na resposta institucional aos ataques de 2023. A Corte reforçou o papel do Judiciário na defesa da Constituição e do Estado Democrático de Direito.
Organizações da sociedade civil, como a Transparência Internacional Brasil e o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), destacam que a responsabilização dos envolvidos é fundamental para evitar a repetição de episódios semelhantes.
A condução do processo pelo STF também será observada por organismos internacionais, como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Sistema das Nações Unidas, que acompanham o fortalecimento institucional no Brasil.
Para o cientista político Leonardo Barreto, da Consultoria FSB, “o julgamento de Bolsonaro será um divisor de águas na relação entre instituições e lideranças populistas”.
Reflexos no Amazonas e em Manaus
O julgamento também pode impactar o cenário político no Amazonas. A bancada federal do estado conta com nomes alinhados ao ex-presidente, como o deputado Capitão Alberto Neto (PL-AM), que tem defendido Bolsonaro publicamente.