Gasolina em Manaus já caiu R$ 0,82 mas postos mantêm preço elevado
Situação expõe suspeita de cartel e omissão pública em fiscalizar.
Por
José Silva
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A gasolina vendida em Manaus permanece entre as mais caras do país, mesmo após sucessivas reduções nos preços da Refinaria da Amazônia (Ream), antiga Reman, privatizada no fim do governo Bolsonaro. Desde dezembro de 2024, o litro do combustível caiu R$ 0,82 na refinaria, mas ainda é vendido a R$ 7,29 em quase todos os postos da capital amazonense.
A discrepância levou o vereador Rodrigo Guedes (Progressistas) a denunciar publicamente o que classifica como “cartel da gasolina”, alegando omissão de autoridades e prejuízo direto à população.
A realidade pós-privatização: preços à parte do Brasil
Com a privatização da Reman, Manaus passou a seguir uma dinâmica própria de preços, desvinculada da política nacional da Petrobras. A nova gestão da refinaria, agora privada, aplica variações que, em tese, deveriam refletir mais diretamente nos valores repassados às distribuidoras e aos postos.
Contudo, segundo denúncias do vereador, a cadeia de revenda na cidade não tem repassado essas reduções ao consumidor final.
“De dezembro até abril, a refinaria baixou R$ 0,82 no preço da gasolina. Mesmo assim, nas bombas dos postos de Manaus o valor aumentou R$ 0,30. Isso é inadmissível”, declarou Guedes em vídeo publicado no dia 11 de abril.
Vereador Rodrigo Guedes vem denunciando situação constantemente e cobrando ação dos órgãos fiscalizadores – Reprodução
Pressão popular versus silêncio institucional
O parlamentar vem formalizando denúncias ao Procon-AM, ANP, Ministério Público, Defensoria Pública e demais órgãos. Apesar das ações, Guedes afirma que está sozinho na cobrança por respostas:
“Temos 41 vereadores, 24 deputados estaduais, 8 federais, 3 senadores… e só eu estou falando sobre isso”, critica o vereador.
Ele argumenta que, se o preço na refinaria tivesse subido os mesmos R$ 0,82, os postos já teriam reajustado para cima com agilidade, talvez até com margem maior.
Como o preço da gasolina é formado
A composição do preço dos combustíveis é complexa e envolve quatro fatores principais:
Preço de realização (refinaria ou terminal)
Custo do biocombustível (como etanol anidro)
Margens de distribuição e revenda
Tributos federais e estaduais
Fonte: Cartilha de Formação dos Preços dos Combustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Sefaz-AM.
De acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), vigora no Brasil liberdade de preços. Isso significa que cada agente econômico define seu próprio valor de venda, tanto na produção quanto na revenda. Portanto, não há obrigatoriedade legal para os postos reduzirem os preços quando há queda na refinaria.
Liberdade de preços não é licença para cartel
Embora os preços não sejam tabelados, a uniformidade absoluta de preços entre os postos pode configurar formação de cartel, o que é proibido pela legislação brasileira (Lei nº 12.529/2011). A ANP e o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) são os órgãos responsáveis por investigar e coibir práticas anticoncorrenciais.
A denúncia feita por Guedes sugere que todos os postos de Manaus praticam exatamente o mesmo valor, independentemente de bandeira ou região. Essa prática, caso comprovada, pode resultar em multas, interdições e processos criminais para os envolvidos.
Omissão ou conivência institucional?
A indignação do vereador não se limita aos donos de postos. Ele aponta falhas graves por parte dos órgãos reguladores e da classe política amazonense, que segundo ele, não se mobilizam para defender o consumidor.
“A omissão é muito pior do que a ação. Omissão mata, rouba, tira a saúde e a dignidade”, afirmou.
Impacto direto no bolso dos manauaras
Com mais de 1 milhão de veículos registrados em Manaus, se cada um consumir cerca de 100 litros mensais, os R$ 0,82 não repassados somam um prejuízo de R$ 82 milhões por mês à população, segundo cálculos do vereador.
Além disso, o cenário afeta diretamente o custo de vida, impactando desde o transporte público até o frete de mercadorias, com reflexos no preço final dos produtos.
Há solução legal para forçar a queda?
A ANP deixa claro que não pode obrigar a redução de preços por parte dos postos, mesmo quando há queda nas refinarias. Porém, práticas como combinação de preços entre concorrentes podem e devem ser investigadas.
Segundo o site da ANP:
“A ANP atua na defesa da concorrência por meio de ações de monitoramento de preços e, quando necessário, encaminha indícios de condutas anticoncorrenciais ao CADE”.
Portanto, a única forma de forçar o repasse das reduções é via ação fiscalizadora e repressiva contra condutas ilícitas, como a formação de cartel. E isso exige articulação entre ANP, CADE, Procon e Ministério Público.
E agora?
A denúncia feita por Rodrigo Guedes levanta uma questão urgente: por que, em meio a sucessivas quedas no preço da gasolina na refinaria, os consumidores de Manaus continuam pagando um dos preços mais altos do Brasil?
Cabe às autoridades competentes dar resposta à população e investigar se há cartelização e omissão deliberada. E cabe à sociedade pressionar para que essa apatia institucional seja rompida.